As administrações tributárias de Angola e Portugal vão passar a trocar informações sobre contribuintes com interesse nos dois países, segundo o acordo de assistência administrativa mútua e cooperação em matéria fiscal assinado por ambos os governos.
O acordo foi promulgado pelo Presidente João Lourenço no final do ano e publicado em Diário da República a 31 de Dezembro, na sequência da visita que o chefe de Estado realizou a Portugal entre 22 e 24 de Novembro.
Assinado pelo Ministro das Finanças de Angola, Archer Mangueira, e pelo secretário de Estado Adjunto e das Finanças de Portugal, Ricardo Mourinho Félix, o acordo, lê-se no documento, visa a “cooperação em matéria fiscal” entre os dois países e reveste-se “de grande utilidade na aproximação e sistematização fiscal das relações” entre Luanda e Lisboa.
“Uma vez que visa criar oportunidades para promoção de investimento e das relações comerciais entre os dois Estados”, acrescenta o documento.
Em concreto, o acordo define que as autoridades tributárias dos dois países passam a prestar assistência administrativa mútua, “seja a pessoa visada residente ou nacional de uma parte (Portugal ou Angola) ou de qualquer outro Estado”.
Passa igualmente a ser possível a prestação de assistência administrativa entre os dois países, “através da realização de controlos fiscais simultâneos e da participação em controlos fiscais no estrangeiro”.
O acordo esclarece ainda que este “controlo fiscal simultâneo” acontece em cada um dos países e visa analisar “a situação tributária de uma ou mais pessoas, nas quais as partes tenham um interesse comum ou complementar”.
“Tendo em vista a troca de qualquer informação obtida por esta via, que seja previsivelmente relevante para a administração ou execução da legislação interna das partes, respeitante aos impostos abrangidos pelo presente acordo”, justifica ainda o documento.
Os dois países passam a cooperar em matéria fiscal também através da celebração de acordos entre ambas as autoridades competentes, para a realização de estágios e outras acções de formação, bem como para o intercâmbio de estudos técnicos, procedimentos e experiências no domínio da administração tributária”.
O Estado angolano terá gasto mais de 700 mil euros para monitorizar, externamente, a execução de dois planos governamentais, com várias medidas fiscais.
De acordo com um despacho presidencial de 6 de Fevereiro de 2018, em causa estava a “necessidade da boa implementação das acções do Ministério das Finanças” no Plano Intercalar do Executivo, a seis meses, aprovado no final de Outubro de 2017, e no Plano de Estabilização Macroeconómica (PEM), para 2018.
Para o efeito, o Presidente João Lourenço autorizou, no mesmo despacho, a contratação da empresa Tendências — Consultoria Integrada, por 890 mil dólares (730 mil euros), que nomeadamente iria acompanhar a execução das medidas de domínio fiscal incluídas no PEM.
“Havendo necessidade de se proceder ao acompanhamento e à monitorização dos referidos planos, mediante a contratação de serviços de consultoria especializada para reforçar e subsidiar todas as etapas da execução dos mesmos, bem como auxiliar o Ministério das Finanças na condução das acções para a consolidação fiscal e permitir uma adequada formação dos seus técnicos para uma apropriada internalização e gestão das referidas acções”, justifica o despacho.
O Governo previa aplicar, até final de 2018, 109 medidas de políticas fiscal, cambial e monetária, bem como garantir maior solidez ao sector financeiro, segundo o PEM, apresentado em Janeiro d ano findo. De acordo com a síntese do documento, foram definidos 36 objectivos a atingir nas quatro áreas identificadas como de actuação prioritária, no quadro da crise económica e financeira que afecta Angola.
O plano preparado pelo executivo liderado desde Setembro de 2017 por João Lourenço prevê “109 medidas concretas que permitirão atingir estes objectivos”, garantoa o resumo, prometendo acções durante todo o ano de 2018.
Desde logo, em termos objectivos de política fiscal e de despesa do Estado, fortemente afectadas pela quebra nas receitas com a exportação de petróleo desde 2014, o PEM previa a adopção de uma “Abordagem Orçamental Plurianual prudente e realista” e um plano para assegurar a implementação efectiva do quadro legislativo das finanças públicas focado “na aplicação de medidas punitivas”.
Também seria proposta legislação que obrigue os titulares de cargos políticos, de direcção e chefia a “declararem as empresas com as quais apresentam eventuais conflitos de interesse”, lê-se no resumo do documento.
“Convergir para concursos públicos abertos obrigatórios para toda a despesa pública” e garantir a “exequibilidade” do Programa de Investimentos Públicos “e alinhamento da carteira com a política de desenvolvimento”, além de “acelerar o pagamento dos atrasados” e garantir a “racionalização e melhoria da qualidade das despesas do Estado” eram outros objectivos do PEM.
Seria ainda definida uma estrutura “para assegurar o maior alinhamento do preço dos produtos refinados, água e electricidade com os preços de mercado” e um plano de acção “para a redução dos custos da folha salarial do estado, focando na meritocracia, ajustamento da função administrativa”.
No mesmo documento, o Governo refere que o diagnóstico feito às contas públicas indicou que, como “qualquer agregado familiar faria”, o Estado “também precisa reduzir a sua despesa e buscar outras fontes de receitas, além do endividamento”.
“A isto se designa, ajuste fiscal ou ‘consolidação’ fiscal que terá início já em 2018”, lê-se no resumo do PEM, que recorda que a queda na cotação do barril de crude no mercado internacional levou à redução das receitas de exportação petrolíferas angolanas, de 68 mil milhões de dólares para 26 mil milhões de dólares (56,3 mil milhões de euros para 21,6 mil milhões de euros), entre 2013 e 2016.
Para “aumentar a robustez das receitas tributárias”, o Governo pretende aplicar “taxas mais elevadas” para produtos de luxo, jogos, lotarias, bebidas alcoólicas e casas nocturnas, fazendo ainda uma revisão da pauta aduaneira e das isenções tributárias, bem como uma análise à possibilidade de “implementar uma estrutura judicial focada no tratamento célere de matérias fiscais”.
Também este ano avança a aplicação do Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA).
O sistema fiscal visa a satisfação das necessidades económicas, sociais e administrativas do Estado e uma repartição justa dos rendimentos e da riqueza. Os impostos só podem ser criados e extintos por lei, que determina a sua incidência, taxas, benefícios fiscais e garantias dos contribuintes. (Art. 14 da Lei Constitucional – Princípio da função económica e social do fisco e Princípio da legalidade).
Todos os cidadãos são iguais perante a lei e gozam dos mesmos direitos e estão sujeitos aos mesmos deveres, sem distinção da sua cor, raça, etnia, sexo, lugar de nascimento, religião, ideologia, grau de instrução, condição económica ou social (Art. 18º – Principio da não discriminação e da igualdade dos cidadãos perante a lei).
A definição do sistema fiscal e a criação de impostos é da competência da Assembleia Nacional, podendo, igualmente, ser do Governo desde que autorizado por lei passada por aquela. (Arts. 90º e 91º).
Os deputados e os grupos parlamentares não podem apresentar projectos de lei que envolvam, no ano económico em curso, aumento das despesas ou diminuição das receitas do Estado fixadas no orçamento (Art. 93º – Princípio da estabilidade do fisco).
Folha 8 com Lusa